sábado, 15 de junho de 2013

Alto do Poio a Samos (21 Km)

Etapa 25 (23/05/12) - dia de autoconhecimento e solitude (na minha própria companhia).

O amanhecer da Galícia é muito lindo, com paisagens exuberantes...
Campinas e muitos pastos...

Planejei seguir até Samos... mas depois da frustração de não ter ficado no dia anterior no Cebreiro, exercitei fixar em outro pensamento, mentalizava a todo momento: se der para ficar em Samos que aconteça normalmente, caso contrário, seguirei em frente. Caí na real que nem sempre as coisas acontecem como planejamos.
Nesta etapa andei sem companhia de peregrinos... passava um ou outro muito esparsamente.
Algumas descidas e trechos bem planos deram um ar de tranquilidade ao dia, que foi bastante contemplativo e de reflexão. Quando caminhamos sozinhos a introspecção acontece facilmente. Parei por uns 30 minutos neste local e fiquei pensando na vida... um silêncio acolhedor, só interrompido pela suave brisa... 
Mais uma vez indagando quais as razões que me levaram ao Caminho... e pensando se o objetivo tinha sido alcançado... comecei a sentir que uma parte deste pequeno ciclo começava a se completar...
Após lindos bosques, passei por Triacastela... 
É uma cidade pequena, mas com várias opções de bares, restaurantes, albergues e hostais...
Fiz uma pequena parada para oração na Igreja de Santiago, uma construção românica, graciosa e bem aconchegante. 

Na saída há uma bifurcação, onde o peregrino deve fazer a opção de prosseguir por Samos ou por San Xil, ambos desembocarão mais adiante em Sarria. Optei pela esquerda, por Samos, mesmo aumentando o percurso em 6 Km.
Margeei a autopista por uns 2 Km, com pouco tráfego de veículos.
Interessante o cuidado com as encostas. São instaladas telas protetoras contra possíveis deslizamentos de pedras.
Imaginei passar uns tempos numa casinha como esta, incrustada na rocha. Maravilha!
Daí em diante foram paisagens lindas, com bosques, pequenos rios e cachoeiras.
Em alguns momentos, passava cerca de 30 minutos caminhando embaixo das sombras das árvores... 
Povoado de Lastres, 5 ou 6 casas somente.
Povoado de San Martiño.
Parei numa casa onde havia um veículo bastante antigo à venda... bati palmas para ver se chegava alguém a fim de fornecer informações, mas quem apareceu foi um cão latindo, não pensei duas vezes, bati em retirada rapidamente... hehehehe
Finalmente cheguei ao destino de parada nesta etapa: Samos!
Do alto se avista logo o imponente Monastério da cidade.

Fiquei alguns minutos contemplando lá de cima, senti uma transmissão de coisas boas, nem sei como explicar, era muito prazeroso chegar naquele local... como se algo muito forte estivesse me chamando.
Samos quer dizer "lugar onde se ora". Possui cerca de 1.700 habitantes e constitui-se um ponto místico do Caminho. A cidade estava muito tranquila, poucas pessoas circulando nas ruas.
Tinha programado ficar no albergue do próprio monastério, mas só abriria às 15h e ainda eram 13h. Fiquei na porta pensando o que fazer...
Logo à frente observei um outro albergue, o Albaroque, nem pensei em esperar, pois estava ávido por um banho. Boas instalações, ao custo de 9 euros, mas pequeno, contando somente com 10 lugares. Foi inclusive aonde almocei um delicioso pulpo à galega. 

À tarde saí para dar uma volta e conhecer o Monastério, também chamado de Mosteiro de San Julián de Samos. Trata-se de uma construção medieval, do século VI, pertencente à Ordem dos Beneditinos.  

Tem capacidade para acolher confortavelmente 150 monges, só que naquele dia estavam em retiro somente 15.
O conjunto arquitetônico dispõe de uma igreja, em estilo barroco, construída em 1748.

Após percorrer externamente o monastério, adentrei às instalações internas, realizando uma visita guiada por um monge, o qual gentilmente forneceu muitas informações. 
Corredores lindos, com quadros e pinturas cuidadosamente bem conservadas, as quais contam a história do monastério.
 
 
O monastério possui dois claustros: o pequeno, construído em 1539; e o grande (foto abaixo), construído entre 1685 e 1689, com cerca de 3.000 m², considerado um dos maiores da Espanha.
 
Por volta das 19:30h, retornei ao monastério, a fim de assistir a uma missa. O encarregado do albergue reuniu cerca de 30 peregrinos, e nos conduziu a uma pequena capela no interior do monastério. Passamos por diversos corredores e escadarias, sempre com a recomendação que fizéssemos silêncio. 
Acomodamo-nos em bancos, e aos poucos os monges sentavam-se nas cadeiras próximas ao altar. No início, o grupo inquieto de peregrinos demorou a entrar em sintonia com o silêncio e quietude do ambiente. Foram aproximadamente 20 minutos antes de começar a cerimônia. Naquele instante, não houve nenhum pedido de silêncio, apenas foi aguardado o tempo da percepção de cada um. Excelente sensação... concentrei em mim, ouvindo minha respiração e meus batimentos cardíacos, transportando-me e imaginando como seria isto no passado.
Só depois deste precioso tempo, foi iniciada a missa, em espanhol e com cantos gregorianos. Lindíssima e emocionante! Lembrei das histórias que meu pai contava quando foi interno do Colégio Salesiano em Salvador.

Ao dormir, indaguei-me sobre a resposta do que estava me chamando em Samos: em especial, tive a certeza que foi o encontro do autoconhecimento e a plenitude do meu ser!

8 comentários:

  1. Que lugares lindos Kel !!!
    Sempre postando coisas maravilhosas

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  2. Sem dúvida uma experiência enriquecedora esse chamamento e as sensações percebidas. O caminho nos leva a situações que nem sempre ficam claras inicialmente. Só depois nos damos em conta daquilo que aquele sinal queria dizer. Muito bom vc. ter contado isso prá gente. Obrigada!

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    1. Então Andrea, não é que o chamamento continua? rsrsrsrs

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    2. Sim Kerjean! O Caminho nos chama! Especialmente no meu caso em que deliberadamente fiz os 306 Km. Então, algo ficou por acabar. Sinto uma necessidade premente de retornar, de rever, de completar a partir do início. Agora com os olhos mais maduros e sem tantos medos. Esse percurso de Sarria a Santiago me marcou sobremaneira. Foi justamente na saída de Sarria que conheci Tony um espanhol, que por sua vez nos apresentou a Christian e Jaime (dois chilenos) e que nos levou a Nathalie (francesa). Formamos então um sexteto. Uma pequena família que se auxiliou mutuamente até o final. Com eles me encontrei em 2011 na Itália e tivemos a oportunidade de passear pelo Vêneto. Cada trecho do Caminho marca a nossa vida, mas esse de Sarria, foi especial. Ah! Também tomei carreira da vaca exatamente naquele mesmo lugar em que estava a alemã. Depois de Sarria, pernoitamos em porto Marin também. Porém era um outro albergue. Rumamos até Palas de Rei e fomos parar em Ribasdiso de Baixo. Bem na zona rural. O albergue era aconchegante, porém fazia muito frio e tivemos que acender fogo. Nessa noite fizemos mais uma vez a comida em grupo, cantamos, rezamos e tomamos vinho até a hora de dormir. Foi inesquecível. Não havia panelas e então tomamos emprestado dos camponeses que viviam ao lado. Que gente simpática!
      Muito bom rever esse trecho por meio de sua experiência. Obrigada por compartilhar!

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    3. Olá Andrea,
      Mas as coisas não tem fim, sempre ficamos neste sentimento que falta algo para completar determinados ciclos!
      Quando sair do início, lá de SJPP, e terminar em Santiago, com certeza sentirá que poderia ter saído de Somport, no Aragonez, ou do Porto, no Português... sempre queremos mais e mais...
      No decorrer do caminho somos marcados e marcamos muitas pessoas, e que até hoje mantemos contatos, mesmo que distantes fisicamente, sempre haverá algo que no unirá para sempre!
      O medo faz parte de cada caminho, sempre haverão determinados medos!
      A Galícia é maravilhosa, também muito mais cara! Hehehehe
      Também fui muito bem acolhido no caminho, alguns hospitaleiros fenomenais!
      Ahhhh, estou precisando voltar ao Caminho...

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  3. Em 2003 passei por Samos e adorei o lugar. Quando resolvi voltar ao Caminho em 2011, resolvi que ficaria ali e tudo deu certo. Experiência maravilhosa e inesquecível!! Belas fotos que ilustram bem a beleza desse trecho.

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    1. Samos foi tudo de bom em meu Caminho!
      Grato pela visita Luciana.

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